Friday, June 10, 2005

Anjo da guarda minha companhia

A partir daquele momento lembro-me de ver, por momentos, uns peitos ridículos amarfanhados a ferro e cetim em direcção a um tecto rústico, como eu. Era menina a menina do bar. Lembro-me dos copos que ela me foi passando pelas mãos. Eram, duvido, de vidro, transparentes para deixarem exibir o que lá dentro se misturava. Passei, sem dar por isso, a gostar da expressividade da vodka e da simplicidade do limão. Passei a adorar as misturas por descobrir que representam perfeitamente as realidades sistémicas. A expressividade da vodka e a simplicidade do limão misturadas valem muito mais que a singularidade das suas partes. É como uma antena que, desprovida de um corpo receptor (rádio ou televisão), continua a captar ondas hertzianas mas perde o significado do todo, como uma rádio que sem um público perde a razão para a sua emissão. Imagine-se um corpo todo separado nas suas componentes. De nada serve um coração bombear se não tiver veias para conduzirem a sua energia. De que servem as veia condutoras se não existirem as células receptoras? De que valem as células se não representarem o invólucro de tudo o que nos segura as palavras, os pensamentos, as atitudes, termos basilares da socialização? Por isso é que a força do todo é muito maior que a força de cada uma das partes somada separadamente - Que é que isto importa? (Mais uma vez) Nada!. Importa sim pois lembro-me de absorver a dita mistura, uma, duas, três, quatro, daí em diante pouco mais me lembro. Senti o meu pensamento no meu estômago e o meu estômago nas minhas entranhas... Depois desalinhei tudo numa imagem difusa para que o estômago não manifestasse a incompreensão que aquele momento lhe incutia. Vi faróis passarem por mim em movimento, vi luzes estáticas a iluminarem-me o caminho, vi o verde dos semáforos a desconcertar as outras duas cores primárias – não consigo entender porque não substituem o verde composto do semáforo pelo azul primário, como não consigo entender porque teimo em ser do Sporting. Vi o alcatrão entrar-me narinas dentro como ar forçado. Sempre contra mim, mim adentro, adentro de mim. Depois, tudo era vermelho, depois, tudo era vermelho irreflectido, reflectido intermitentemente de azul.
Mas houve alguém que me levantou, que apanhou os pedaços de mim e inteiro me levou a casa, segurando-me com as duas mãos, tentando manter a força sistémica do todo. Foi uma presença ali umbilical, minha. Uma presença que a ordem das coisas não permite ser de mais alguém. Uma presença que trago a cada momento com a mesma necessidade do ar que respiro: O meu anjo da guarda.

2 Bocas:

Anonymous Anonymous Disse...

I sit and wait
Does an angel contemplate my fate
And do they know
The places where we go
When we're grey and old
'cause I've been told
That salvation lets their wings unfold
So when I'm lying in my bed
Thoughts running through my head
And I feel that love is dead
I'm loving angels instead

And through it all she offers me protection
A lot of love and affection
Whether I'm right or wrong
And down the waterfall
Wherever it may take me
I know that life won't break me
When I come to call she won't forsake me
I'm loving angels instead

When I'm feeling weak
And my pain walks down a one way street
I look above
And I know I'll always be blessed with love
And as the feeling grows
She breathes flesh to my bones
And when love is dead
I'm loving angels instead

Angels - Robbie Williams

2:24 PM  
Anonymous Anonymous Disse...

Eu ainda bem que tenho o meu anjinho comigo, senão precisava de duas vidas para aguntar com os meus sofrimentos.

6:08 PM  

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